Medo: acolher ou reprimir?
O senso comum considera o medo um sentimento ou uma emoção, mas ele é um afeto, porque resulta de um estímulo para o qual o sujeito produz uma resposta. Essa resposta virá de acordo com o conjunto de emoções que o medo evoca em cada sujeito. Ler as emoções envolvidas nesse afeto é um passo fundamental para podermos lidar com ele.
O medo faz parte da natureza humana. Impossível passar a vida sem ele e imaginar uma realidade que não o comporte em algum grau.
Apesar de termos conhecimento disso, aprendemos primeiro a denegar o medo em nós: afinal, não somos corajosos? Vivemos como se o medo indicasse uma fraqueza, e assim seguimos a vida apoiados na crença de que alguns afetos e emoções — medo, angústia, culpa, raiva, ciúme — não deveriam existir.
Reprimir o medo: as consequências possíveis
Reprimir ou anular o medo fingindo que ele não existe, não observar os sentimentos que estão sendo tocados por esse afeto, pode levar a quadros de depressão, ansiedade e outros distúrbios emocionais, inclusive abrindo espaço para desencadear a síndrome do pânico.
Durante a infância, o medo é simbolizado. Isto é, a criança consegue traduzi-lo por meio de lágrimas, gestos, gritos. Se nesse período houver um acolhimento por parte dos adultos responsáveis por seus cuidados, poderá resultar daí um adulto mais maduro, capaz de ler as emoções envolvidas nesse afeto.
Por outro lado, o adulto a quem foi ensinado na infância a reprimir o afeto do medo e que não pôde aprender a acessar as suas emoções, como consequência pode adoecer – tristeza, depressão – ou até se tornar um sujeito agressivo e raivoso. Quanto mais maduro, melhor o sujeito lida com suas emoções e pode apropriar-se das inúmeras possibilidades de manejar esse afeto. Pode, principalmente, aprender a simbolizá-lo: isto é, a traduzi-lo em gestos e palavras.
O adulto que alcança essa maturidade frente aos seus próprios medos estará mais apto a ajudar a desenvolver nas crianças sob sua responsabilidade a educação emocional, aquela que permite perceber e falar abertamente sobre os sentimentos.
O medo produz também efeitos positivos e precisa ser acolhido e reconhecido em nossas vidas e na vida dos que nos cercam. É ele que nos ajuda a fazer escolhas, auxilia na autopreservação e pode nos levar a produzir e a criar.
Foi o medo que nos fez adotar medidas de proteção e cuidados para, por exemplo, não contrairmos o vírus durante a pandemia que se iniciou em 2020.
Medo também pode ser o estopim da angústia, e desde Lacan sabemos que “a angústia é causa de desejo”. É a angústia que nos põe para trabalhar.
O medo vai evoluindo ao longo da vida porque vamos conquistando o desejo que atravessa o medo. Se no começo o medo é realístico e tem um objeto, depois ele muda. O medo é um indicador das imediações do desejo.
Cristian Dunker
De outro modo, eu diria que o medo é o precursor da angústia e que ele, ao perder consistência ao longo de um percurso de análise, nos aproxima do nosso desejo. Medo e angústia, portanto, são a mola propulsora do desejo. E é o desejo que move a vida.
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Referências